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SUPERAR A CANTILENA GOLPISTA

As jornadas de junho trouxeram novos ânimos para a política brasileira. Mesmo não tendo ainda se traduzido em alterações importantes no regime social, político e econômico do país, as manifestações que ganharam as ruas trouxeram para o ambiente político, de modo definitivo, o anseio massivo por mudanças.

Associado a isso há na agenda política um avanço do debate de pautas de cunho progressista, como a legalização do aborto, das drogas, medidas de combate à homofobia, enfrentamento ao racismo, etc.

Diante desta conjuntura é esperado que saia, cada vez mais “do casulo”, um setor social que sempre remete-se com saudosismo aos tempos militares. Trata-se da expressão do pensamento mais conservador que não concebe nenhuma forma de democracia e que manifesta seu apreço por regimes totalitários, representados em consignas como “Tradição, Família e Propriedade”. Mas fica a provocação: Qual a adesão social deste discurso?

Há 50 anos atrás o mundo estava polarizado entre um campo socialista e capitalista. A “ameaça comunista” era dotada de possibilidades políticas, pois desde o início do século o mundo viveu revoluções de cunho socialista que ameaçaram o ideário liberal que guiava o ocidente.

Assim, a “ameaça comunista” não era apenas um jargão, pois há 5 anos antes de 1964 estava a Revolução Cubana que ganhava “corações e mentes” na América Latina e trazia perigo para a hegemonia estadounidense. Concretamente, Cuba sufocava a supremacia da propriedade privada, propriedade essa que embalava muitos setores sociais no Brasil.

Outro aspecto trata do lugar dos militares. Diferentemente de hoje, os “milicos” eram, de alguma forma, identificados com um ideário de defesa da pátria. Mesmo porque havia setores progressistas que em outros momentos do país operaram transformações de cunho progressista, a exemplo da Revolta dos Tenentes que guardou relação com anseios populares.

Ou seja, os militares neste tempo possuíam adesão social, o golpe não se colocava em defesa de setores privilegiados, mas era dotado de um discurso de nação que embalava as maiorias – não só a “classe média”, mas também parte considerável das massas trabalhadoras.

Outro fator trata dos interesses econômicos e políticos em questão. Para além da geopolítica mundial, em que a Revolução Cubana gerou a reação estadounidense pró-ditaduras na América Latina, havia sob a liderança de João Goulart uma organização crescente do povo trabalhador pró-reformas de base. Exemplo eram as Ligas Camponesas no Nordeste que, associada ao ímpeto reformista de Jango, ameaçavam de fato o latifúndio.

Ou seja, naquele momento de Brasil havia ameaça real aos interesses monopolistas, latifundiários e imperialistas, o que não reflete a realidade atual, mesmo estando o país sob a condução de um partido sob a consigna dos trabalhadores.

Por tudo exposto, somos categóricos em dizer que um intento golpista não condiz com a realidade atual. Os bancos vão bem, o governo segue estimulando a criação e fortalecimento de monopólios industriais e de serviços, os setores da mineração e do latifúndio estão no controle e o imperialismo não encontra nenhum confronto contundente com o governo atual. Mesmo porque as relações do governo brasileiro no âmbito da América Latina não caminham no sentido da formação de um bloco de poder alternativo – como tanto desejou e propagou Chávez.

Os militares estão desmoralizados, são odiados por amplos setores sociais, seja porque matam o povo negro na favela, motivados pela ideologia da guerra (que tem o pobre como inimigo e a propriedade privada como sujeito de defesa) ou, seja porque geram repulsa em setores médios que são avessos a medidas restritivas (no trânsito, no uso de drogas ilícitas...) e que propagam aos quatro cantos a aversão às barbaridades do regime militar.

A Guerra Fria acabou, ainda que a postura de Putin na Criméia faça relembrar algum nível de polarização. Mas, definitivamente, Putin não é nenhum líder socialista, muito pelo contrário. O comunismo hoje não ronda mais como ameaça pulsante, trata-se de uma ideologia que segue atual, despertando interesses e curiosidades, mas não se trata do “fantasma” de 50 anos atrás. 

O que pode haver, numa outra conjuntura, é um intento golpista que articule um amplo tecido social, caso interesses políticos e econômicos sejam ameaçados. Dizer que não existe essa conjuntura hoje não significa negar sua possibilidade no futuro.

No entanto, devemos responder a conjuntura que nos é imposta, e alimentar um intento golpista que não está colocado joga, inclusive, água no moinho do governo petista, pois se o golpe for uma realidade vale tudo para defender o status quo, o que mais importa é defender uma estabilidade supostamente ameaçada, ao invés de concentrarmos nossas energias na construção da agenda de mudanças necessárias.



RETOMAR A AGENDA DAS REFORMAS DE BASE

Eis o ponto central a ser tratado num momento histórico marcante, em que repudiamos a interrupção dos avanços populares que se desenhavam no governo de Jango. 50 anos após o golpe e não vivemos a reforma agrária, a reforma urbana, a reforma tributária, a reforma universitária, a reforma política.

O máximo que conseguimos depois da ditadura foi canalizar a retomada progressista numa Constituição que traduziu os anseios das maiorias em direito formal. Depois disso, vivemos tempos de ofensiva neoliberal em que todo esforço se deu na canalização da eleição de um governo popular que, mesmo após evoluir, eleição após eleição, o seu discurso para os termos da conciliação de classes, ainda em 2002 falava de tais reformas.

Já se vão três governos do PT e o máximo que conseguimos foi ver a ampliação das Políticas Sociais que são importantes, porém limitadas, do ponto de vista do enfrentamento da condição capitalista-dependente do Brasil. Já as tais reformas de base que foram interrompidas em 1964 ainda estão por se realizar e não temos motivo algum para entender que elas serão gestadas no âmbito deste governo dirigido por um partido sob a consigna dos trabalhadores.

Se é válido o argumento de que em 2003 não havia força social suficiente para operar grandes mudanças ele declina diante do acuamento do governo perante a maior manifestação espontânea já vista no Brasil, em 2013. Se é válido o argumento de que o governo “não esperava” tais manifestações e ouviria, daí por diante, o pleito das ruas ele declina perante a inoperância do governo diante da “já esquecida” proposta de reforma política, diante da intocabilidade do empresariado dos transportes, diante da condição de refém da ira peemedebista por mais espaço no governo, diante da discussão da “lei antiterrorismo” e do manual do Ministério da Defesa chamado GLO (Garantia da Lei e da Ordem)...” oferecidos como “resposta” às manifestações que se avizinham.

Caberá às forças populares que seguem apostando na força das ruas e na luta do cotidiano das massas pautar uma agenda que, após 50 anos, retome de maneira substantiva as reformas necessárias para a construção de uma Pátria Livre, identificada com seu povo.

Para isso, não basta lembrar e reivindicar após 50 anos a memória da intelectualidade branca que foi engolida pela sanha militar. É necessário ir além e lembrar que essa mesma estrutura militar que segue moendo nosso povo também matou em massa o povo preto e de periferia. A subversão necessária passará, invariavelmente, pela construção de Uma Nova Maioria.



Pátria Livre, Venceremos!



Reforma Agrária, Já!

Reforma Urbana, Já!

Reforma Política, Já!





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31 de março de 2014

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